A canga é uma peça de madeira que prende o boi à carroça ou à moenda facilitando o uso de sua força para trabalhos variados. Dito isto, fica fácil pensar nos cangaceiros como homens revoltados com a “canga” imposta por uma vida de dores e sofrimentos, ou em homens aptos a impor por meio da força bruta a “canga” sobre outros. A entrega dos homens ao banditismo no sertão brasileiro deu-se inicialmente em meados do século 18, num contexto social onde imperavam a falta de perspectiva, a miséria e a fome física aliada à de justiça. Esse cenário cheio de contradições e possibilidades inspirou (e inspira até hoje) inúmeros romances, filmes e histórias em quadrinhos.
É interessante ver o fascínio que o cangaço (como tema e gênero notadamente brasileiro) exerce sobre artistas de diferentes origens e culturas, desde o alemão Hermman aos italianos Sérgio Bonelli e Hugo Pratt. Seja pela crueldade, seja pelos ares de revanchismo que assumem, as ações dos bandoleiros do sertão nordestino adquirem tons e formas distintas em cada versão artística proposta. Gedeone Malagola, por exemplo, quadrinizou as aventuras de um cangaceiro inspirado pelo ator Milton Ribeiro, do filme “O Cangaceiro” de 1954 que teve roteiro de Raquel de Queiroz.
O paraibano Emir Ribeiro, em 1979, criou Severino, um agricultor que entra para o cangaço no intuito vingar sua falecida esposa morta nas mãos de cruéis fazendeiros. O Lampião tradicional ganha uma versão ímpar nos desenhos vigorosos e estilizados de Flávio Colin na obra “Mulher-Diaba no rastro do Lampião”, definitivamente um clássico das HQs brazucas. Jô Oliveira no álbum “A guerra do Reino Divino” não ignora a importância dos cangaceiros para se pensar a história e a narrativa nordestina e é a hisória verídica de Virgulino Ferreira que aparece em “Lampião, era o cavalo do tempo atrás da besta da vida” de Klévison Viana.
Nem todos os autores tratam o tema com o mesmo tom. Henfil transferia para seu cangaceiro, Zeferino, sob a égide do humor, pesadas críticas à sociedade brasileira e suas relações de poder. Ainda no humor, entretanto num tom mais ameno, o Xaxado de Cedraz também apresenta seus momentos de crítica e mostra-se um personagem versátil em HQs, tiras e material institucional.
O Capitão Rapadura do cartunista Mino, este também de maneira humorada, mistura um visual inspirado pelos cangaceiros nordestinos com o gênero super-herói.
fantasia ou de ficção científica.
Em leituras recentes o genero aparece em “Cangaceiros, homens de couro” que tem roteiro de Wilson Vieira, desenhos de Eugênio Colonnese e capa de Mozart Couto. A trama retoma a trajetória da vida de Virgulino.
O Cabeleira adaptado do romance homônimo de Franklin Távora ganha vida nos quadrinhos pelo trabalho da equipe formada por Leandro Assis, Hiroshi Maeda e Allan Alex, os dois primeiros, roteiristas e este desenhista. Fora a qualidade intrínseca do texto há que se observar o ótimo uso dos recursos da narrativa do quadrinho.
E é na narrativa criativa e na inovadora união entre cordel e quadrinhos que o cangaceiro Bravo Jan acerta em cheio materializado pela arte de Anilton Freires e texto de Alex Magnus.
Se houvesse uma cadência constante na publicação de títulos nacionais o gênero cangaço muito provavelmente integraria uma boa porcentagem dessas publicações já que dentro do cenário geral do que historicamente tem sido publicado de quadrinhos no Brasil o cangaço ocupa um espaço nobre.
Os títulos e autores aqui citados são apenas um apanhado geral, uma iniciativa de listar por amostragem alguns cangaceiros criados para os quadrinhos, provavelmente muita coisa ficou de fora. Se você conhece outros autores e personagens que gostaria de acrescentar à lista citada deixe a dica nos comentários que ficaremos muito gratos e com isso os comentários se tornam não apenas uma valiosa ferramenta de contato e feedback, mas se tornam uma extensão do conteúdo apresentado acima. (Nota do Editor: Sendo este artigo datado de 2009, vários títulos autores e personagens podem ser acrescidos nos comentários. Obrigado a todos por acompanhar e colaborar com o Laboratório Espacial)
Ótimo resgate
ResponderExcluirEuclides Santos fez talvez a primeira HQ sobre o cangaço em 1938, ano da morte de Lampião
http://blogdogutemberg.blogspot.com.br/2014/11/o-cangaco-nos-quadrinhos.html
Aqui tem uma rara HQ de cangaceiros da Argentina
https://luisalberto941.wordpress.com/2014/04/04/america-y-sus-dibujantes-en-la-historieta-argentina/
Excelente matéria. Entre os que não foram citados, eu adiciono Carrapicho. Criado em 1978, publicado em tiras durante alguns anos e depois em revista. Apesar da breve vida da revista, é um capítulo interessante da história das HQs brasileiras de cangaço, por ter sido revista mensal com distribuição nacional em bancas.
ResponderExcluirMais links
ResponderExcluirhttp://tvmemory.blogspot.com.br/search?q=cangaceiro
http://www.redalyc.org/html/162/16200804/
http://www.texbr.com/misterno/italia/serieregular/misterno003.htm
https://www.mythoseditora.com.br/catalogo/default.asp?acao=detalhe_produto&cod_produto=4558&categ0=8379&categ1=8467&categ2=
O Cabra, cangaço pós-apocalítico
ResponderExcluirhttp://hqmaniacs.uol.com.br/O_Cabra_HQ_combina_ficcao_cordel_e_faroeste_28349.html
Obrigadão pelas informações adicionais, amigos. Se acaso acharem mais coisas o canal está aberto. O material do Danilo Beirute: Bando de Dois teve ótima repercussão quando de seu lançamento em 2010. De lá pra cá deve ter ainda mais coisa a ser listada, será que não? MAis uma vez agradeço os acréscimos de links e informações.
ResponderExcluirTem A Noiva Zumbi do Gonçalo Júnior, ilustrado pelo Fábio Cruz
ResponderExcluirhttp://www.universohq.com/noticias/goncalo-junior-e-fabio-cruz-lancam-noiva-zumbi-na-fest-comix/
Teve Sertão Vermelho (dois volumes) do Edvan Bezerra, que teve desenhos do Eugênio Colonnese, Rodolfo Zalla e Júlio Shimamoto
Lampião - Episódios da Vida de um Cangaceiro por Antonio Lima, Paulo José e Wilde Portela
http://www.guiadosquadrinhos.com/titulos/lampiao
Lucas da Vila de Sant´anna da Feira
http://www.guiadosquadrinhos.com/edicao/lucas-da-vila-de-sant%C2%B4anna-da-feira/lu184100/88246
Como pode ver, muitos faziam western também, tem alguns termos para esse subgênero nordestern, western macaxeira, ou western feijoada, embora só o primeiro seja exclusivo para histórias que envolvam o cangaço, como nos casos do Milton Ribeiro, Juvêncio e Jerônimo.
Exemplos não faltam, não sei se listaram todas.
Teve também Raimundo, o cangaceiro do José Lanzellotti
ResponderExcluirAchei uma curiosa HQ sobre um cangaceiro na série Billy Brandy publicada em 1959 na Argentina
ResponderExcluirhttps://luisalberto941.wordpress.com/2014/04/04/america-y-sus-dibujantes-en-la-historieta-argentina/
Na Itália, teve uma do Pato Donald com três galos que pareciam o Panchito chamada Paperino e il cangaceiro
https://inducks.org/story.php?c=I+AO+55037-A
Também teve um filme italiano chamado O Cangaceiro, que aqui veio como Rebelião dos Brutos:
ResponderExcluirhttp://ocafe.com.br/cinema/o-cangaceiro-marca-invasao-faroeste-italiano-nosso-sertao/
Seria interessante que essas HQs do cangaço fossem digitalizadas e postadas em PDF para quem quisesse tê-las já que não existem em bancas para vendas, é uma forma de não deixar morrer a história do Lampião e seu bando de cabra da peste!
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