—Viu o novo
filme do (...) com aquele cara, o (...)?
—Vi. Achei
uma bosta.
—Ah, vc é um
chato. O filme é irado porque...
—Velho, o
filme é uma bomba porque...
É. Estou
certo que você já se deparou com a situação acima. Mas, espere um minuto. O que
faz um mesmo filme ser, simultaneamente, tão bom e tão ruim? Bem, é disto que
trataremos a seguir.
Os filmes, livros, quadrinhos, as peças de teatro podem ter ou não uma estrutura narrativa. Há produções artísticas cujo objetivo não é contar uma história, mas explorar um assunto, instigar certas emoções, comentar ou questionar algo, mas aqui trataremos de filmes cujo objetivo é o que chamarei de narração de entretenimento. Claro que a narração pode ser usada para fins educativos, informativos, históricos, ilustrativos, mas a narração de entretenimento visa... adivinha?! Exato! Entreter.
Quem conhece o trabalho de Joseph Campbel e de Christopher Vogler ou Syd Field ou mesmo se você já viu muitos filmes —como a Lisbela (do Filme Lisbela e o Prisioneiro, filme de Guel Arraes, 2003)—já se deparou com padrões reconhecíveis nas narrativas cinematográficas. Os quadrinhos gozam de uma liberdade estrutural maior talvez por ser uma mídia distinta, talvez pelos valores de produção não serem exorbitantes, enfim, embora haja uma tendência atual de alongar as narrativas nos quadrinhos, terminando as revistas com um "continua" no final de cada edição para fisgar o leitor, embora os conflitos e ações sejam diluídos em favor de estender as tramas, não há, nos quadrinhos a paranoia de seguir uma estrutura narrativa de modo tão enfático como nas produções cinematográficas.
Disto isto, é bem possível que você faça parte de um público que está adaptado aos picos de emoção promovidos pela estrutura narrativa, com os momentos de apresentação de personagem, apresentação do conflito, dúvida, negação, ameaça, viradas surpreendentes, tomada de decisão, derrota aparente, superação da perda, triunfo e reconstrução de status quo. Bem, usei termos distintos, mas tudo isso está no trabalho dos autores mencionados anteriormente: Joseph Campbel, Christopher Vogler, Syd Field— se ficou curioso procure-os no Google. Caso você já esteja adaptado a este formato e sinta-se confortável com ele, qualquer produção que fuja desse esquema vai provocar um ruído na sua compreensão. Algumas vezes você vai odiar o filme porque algum dos elementos narrativos com os quais você estava habituado não se fez presente. Em alguns outros casos, as explicações e justificativas para as ações de um ou outro personagem podem parecer irreais, frágeis ou inverossímeis — isso também pode estragar o filme pra você. A falta de uma linha clara de condução começo, meio e fim, a falta de conexão lógica entre algumas cenas, a falta de justificativa para algumas dessas cenas. Bem, a quantidade de coisas que podem estragar sua apreciação são inúmeras. Mas também é fato que o filme pode ser considerado ruim por uma maioria esmagadora de pessoas e você, contra tudo e contra todos, sentir uma alegria contagiante vendo o mesmíssimo filme.
Por mais comercial que seja um filme, por mais que se detenha a estruturas, regras, truques de roteiro e construção, por mais técnico que ele seja ainda há ali o fator humano, ainda há um discurso não dito, um discurso que, eventualmente as pessoas podem ler de distintos modos influenciadas pelo seu histórico emocional, por seu nível cultural, por suas experiências de vida etc. Um mau dia no escritório pode estragar a experiência de um filme ou exaltá-la.
Nestes
tempos de redes sociais cada pessoa defende suas opiniões como verdades
absolutas e poucos parecer ter humildade para aceitar que a opinião do outro é
simplesmente distinta da sua. A arrogância de estar certo acima de tudo e de
todos é o padrão que fomenta um colonialismo irascível de opiniões. Estar acima
do outro, ser maior, melhor, mais inteligente tudo isso parece mais importante
que viver sua própria experiência e respeitar a experiência do outro. O
Spoiler , por exemplo, é antes de tudo um desrespeito à experiência do outro. O que nos leva
a um questionamento essencial para esta reflexão textual: Um mesmo filme pode
ser, ao mesmo tempo: ótimo e péssimo? Claro! Pois quem vivencia sua percepção
é você. Tudo bem se todos odeiam seu filme favorito, ele nunca deixará de ter
um significado íntimo e pessoal para você. Isto não é motivo para discussões
inflamadas nem para fins de relacionamentos ou amizades. Respeito é uma atitude
que inspira reciprocidade. Então, lembre-se: o próximo filme (ou Quadrinho) excelente ou
horrível ao qual você tiver chance de assistir (ou ler, no caso dos quadrinhos) sempre terá fãs e detratores. Simplesmente
porque, por mais comercial que seja, aquilo também é arte.
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